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Carta de Pero Vaz de Caminha

Em sua carta a Manuel I de Portugal, Pêro Vaz de Caminha dá o que hoje é considerado um dos relatos mais precisos do que o Brasil parecia em 1500. “Essa vastidão da enorme linha de árvores, com abundante folhagem, que é incalculável”, é uma das descrições mais famosas de Pêro. Ele descreve em um diário desde a primeira viagem de Portugal ao Brasil e sua chegada a este país. Esta carta é considerada o primeiro documento da história brasileira tanto quanto seu primeiro texto literário. O original deste documento de 27 páginas pode ser encontrado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa.

Este é o primeiro documento que descreve a terra e as pessoas do que se tornou o Brasil. Foi escrito no exato momento do primeiro contato com esse novo mundo. Pêro Vaz de Caminha era um oficial encarregado de informar sobre a viagem da frota da Índia comandada por Pedro Álvares Cabral. A Carta é um documento único por causa dos fatos que narra, a qualidade de sua descrição do povo e do território e sua conta do diálogo cultural com um povo desconhecido na Europa até aquele momento. É rico em detalhes e observações astutas que nos fazem sentir que somos testemunhas oculares do encontro. Pêro Vaz de Caminha iniciou a sua carta a 24 de abril e terminou em 1 de maio, data em que um dos navios da frota partiu para Lisboa para anunciar as boas novas ao rei.

Carta de Pero Vaz de Caminha

Informação contextual

Manuel I subiu ao trono numa época em que Portugal estava descobrindo riqueza na África e no Oriente; ele queria garantir que Portugal mantivesse o domínio do comércio com o Oriente.  Portugal estabeleceu a sua presença com enclaves, fortes e postos comerciais fortificados.

Pedro Álvares Cabral liderou a maior frota da frota portuguesa numa missão a Calicut, na Índia, onde o Vasco da Gama abriu uma rota marítima para dois anos antes. Muitos historiadores debateram sobre a autenticidade desta descoberta; alguns têm razões para acreditar que Portugal tinha conhecimento prévio da existência do Brasil. Pêro Vaz de Caminha era o secretário desta frota; ele havia sido indicado para ser o administrador de um posto comercial a ser criado em Calicute. Uma vez que Cabral reuniu os fatos básicos e encontrou o povo nativo, ele levou essa informação e a carta de Caminha em um navio menor de volta a Lisboa.

Descrições de Indígenas

“A feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem fazem mais caso de encobrir ou deixa de encobrir suas vergonhas do que de mostrar a cara. Acerca disso são de grande inocência.”
“… andam bem curados, e muito limpos. E naquilo ainda mais me convenço que são como aves, ou alimárias montezinhas, as quais o ar faz melhores penas e melhor cabelo que às mansas, porque os seus corpos são tão limpos e tão gordos e tão formosos que não pode ser mais!
“E não comem senão deste inhame, de que aqui há muito, e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si deitam. E com isto andam tais e tão rijos e tão nédios que o não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos.
“Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem novinhas e gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas costas; e suas vergonhas, tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as nós muito bem olharmos, não se envergonhavam.”
“E uma daquelas moças era toda tingida de baixo a cima, daquela tintura e certo era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições envergonhara, por não terem as suas como ela.”

O almirante do navio que navegou para o Brasil mandou Nicolau Coelho sair para interagir com os nativos. As pessoas que encontraram quando chegaram ao Brasil viviam de uma mistura de caça e agricultura. Eles eram marrons e avermelhados e completamente despidos. Suas línguas foram divididas em quatro grandes famílias com muitos isolados, e mesmo línguas e dialetos relacionados provavelmente não eram mutuamente inteligíveis, então eles tinham que se comunicar através de ações e línguas de sinais. Eles tentaram dar aos nativos coisas para comer, como pão, peixe, bolos, mel e até vinho. Os nativos pegaram um gostinho das coisas e depois cuspiram tudo fora. Eles também tentaram dar-lhes apenas água, mas os nativos apenas golpearam a água em suas bocas, depois cuspiram. A única coisa que eles consentiram foi um manto que eles poderiam usar para se cobrir enquanto dormiam.

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Análise

Além de ser a primeira descrição literária do Brasil, o que diferencia a carta de Caminha de outros documentos como era seu estilo de escrita. Enquanto escrevia esta carta, Caminha não estava tentando criar uma obra literária, mas tentando relatar exatamente o que encontrou; foi um comentário detalhado sobre os “costumes, religião e características físicas dos povos nativos”. É desprovido de hipérbole e não usa metáforas excessivas para validar descrições. Ele afirma as coisas pelo que elas são, não pelo que ele acha que elas representam. Outros relatos antigos do Novo Mundo enfatizaram a ideia de prosperidade e usam adjetivos e hipérboles para descrever a quantidade e a qualidade de sua recompensa. Há um tom geral de otimismo de que o Brasil fornecerá dons espirituais e materiais. Ele enfatiza a “simplicidade e boa natureza” dos povos indígenas.

Opiniões de Caminha

Caminha não descreveu os brasileiros nativos como bestiais e menos humanos, como é comum com outras narrativas brasileiras antigas. Ele não os descreve como mais ou menos atraentes do que eles e parece ser particularmente fascinado por sua nudez e pinturas corporais. Ele mostra “sentimentos de admiração, encantamento e protecionismo”. Ele acredita que eles são parte da criação de Deus; ele é respeitoso e compreensivo e é por isso que ele pede sincretismo em vez de escravidão. Durante a primeira missa, os brasileiros nativos reagiram favoravelmente e, assim, para Caminha, vale a pena salvar porque “eles não têm aparente vestígio de corrupção espiritual”. Há a suposição de que será fácil converter os povos indígenas ao cristianismo.

Pero Vaz de Caminha: Quem foi, nascimento e morte

Pero Vaz de Caminha foi escritor de nacionalidade portuguesa e participou da esquadra, comandada por Pedro Álvares Cabral, que chegou ao Brasil em 1500. Sua função era de escrivão da esquadra.

Ele nasceu na cidade do Porto (Portugal) em 1450 (dia e mês desconhecidos) e morreu na cidade em Calicute (Índia) em 15 de dezembro de 1500.

Uma das suas principais realizações foi sua participação na esquadra portuguesa que chegou ao Brasil em 1500 e claro a carta que se tornou um importante documento do início da História do Brasil.

A Carta de Pero Vaz de Caminha

Trechos da Carta

“Ali veríeis galantes, pintados de preto e vermelho, e quartejados, assim pelos corpos como pelas pernas, que, certo, assim pareciam bem. Também andavam entre eles quatro ou cinco mulheres, novas, que assim nuas, não pareciam mal. Entre elas andava uma, com uma coxa, do joelho até o quadril e a nádega, toda tingida daquela tintura preta; e todo o resto da sua cor natural. Outra trazia ambos os joelhos com as curvas assim tintas, e também os colos dos pés; e suas vergonhas tão nuas, e com tanta inocência assim descobertas, que não havia nisso desvergonha nenhuma.”

“Todos andam rapados até por cima das orelhas; assim mesmo de sobrancelhas e pestanas. Trazem todos as testas, de fonte a fonte, tintas de tintura preta, que parece uma fita preta da largura de dois dedos.”

“Mostraram-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como se os houvesse ali.

Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso dele.

Mostraram-lhes uma galinha; quase tiveram medo dela, e não lhe queriam pôr a mão. Depois lhe pegaram, mas como espantados.

Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis, mel, figos passados. Não quiseram comer daquilo quase nada; e se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora.

Trouxeram-lhes vinho em uma taça; mal lhe puseram a boca; não gostaram dele nada, nem quiseram mais.

Trouxeram-lhes água em uma albarrada, provaram cada um o seu bochecho, mas não beberam; apenas lavaram as bocas e lançaram-na fora.

Viu um deles umas contas de rosário, brancas; fez sinal que lhas dessem, e folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço; e depois tirou-as e meteu-as em volta do braço, e acenava para a terra e novamente para as contas e para o colar do Capitão, como se dariam ouro por aquilo.”